A terra abre sua boca úmida, faminta de carne vencida,
vermes rastejam em coro lento, celebrando a partida.
O caixão range como ossos partidos no breu da madrugada,
e o ar se preenche do fedor doce da morte instaurada.
A pele racha em tons de cinza, pétala morta de flor esquecida,
os olhos vazios já não refletem nada além da queda consumida.
Unhas se soltam, cabelos apodrecem em nó putrefato,
o corpo se oferece, dócil, ao festim de um banquete insensato.
O solo úmido recebe o corpo como amante frio,
sugando-lhe o sopro, engolindo o vazio.
As costelas estalam num concerto sem som,
e a ossada se curva ao abraço do limbo sem tom.
Entre raízes retorcidas, a podridão floresce,
o crânio racha lento, a dentição esmorece.
Do corpo, só restam vestígios do que foi humano,
um fardo inútil, esquecido no teatro insano.
Nenhum sino dobra, nenhum nome ecoa na lápide fria,
o vento assovia entre cruzes tortas sua elegia.
E do silêncio nasce o eterno, não luz, não paz, não abrigo,
apenas a noite sem fim, devorando a morte como antigo inimigo.
Nenhuma estrela vigia o cadáver vencido,
o breu eterno engole o suspiro perdido.
E quando a terra consome o que resta do mundo,
só a noite governa o silêncio profundo.