Vendem mistério com maquininha de cartão,
tarôs plastificados, mapas astrais genéricos,
promessas de cura embrulhadas em lilás
(sagrado feminino com certificado digital).
Invocam deusas que cabem em apostilas,
misturam incenso com discurso raso,
tentam articular feminismo
com a mesma lógica que sempre explorou mulheres
(o lucro travestido de iluminação).
Já dizia Simone:
não se nasce mulher, torna-se.
Ser mulher é construção social,
não destino místico,
não energia lunar,
não carta virada na mesa.
Não há sagrado.
Somos animais,
frutos do acaso da evolução,
corpos moldados por mutações e sobrevivência.
Não somos escolhidas,
somos existentes
(e isso basta).
Não somos deusas.
Somos seres humanos
da espécie Homo sapiens,
demasiadamente humanos,
inventando transcendências
para suportar o vazio que nos constitui.
Projetamos o sagrado em algo distante
porque aceitar o chão assusta.
Criamos novas eras, alienígenas benevolentes,
forças superiores recicladas,
a mesma superstição antiga
com verniz contemporâneo.
Enquanto isso, o patriarcado segue intacto,
observando de camarote,
rindo de quem parcela em doze vezes
um curso para “encontrar o eu feminino”
(como se a emancipação fosse mercadoria).
Misticismo barato de botequim,
vendido como libertação,
explorando fragilidades reais
para manter tudo exatamente como está.
Para isso há outro nome
e ele não é espiritualidade:
é estelionato.
Nova era, sagrado feminino,
mapas, rituais, promessas de despertar.
Mesma baboseira de toda religião
falsa, falha e fajuta,
que não rompe estruturas,
não enfrenta o poder,
não toca o patriarcado
(apenas o perfuma).
A revolução não cabe em cursos,
não aceita parcelamento,
não vem das cartas nem das estrelas.
Ela nasce do conflito,
da crítica,
da recusa em ser enganada.
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