Levantar da cama todos os dias não é rotina. É milagre. Mas não desses que se contam em igrejas ou se agradecem de joelhos. É um milagre torto, cheio de rachaduras. Um milagre feito de teimosia e de lágrimas silenciosas, derramadas antes mesmo do sol nascer.

O que as pessoas veem, esse levantar, esse cumprir tarefas, esse falar com naturalidade, não é saúde. É sobrevivência. É um tipo de atuação crua, onde o palco é o mundo e o bastidor é um quarto escuro, cheio de pensamentos que não dão trégua.

Não sou forte. E preciso que parem de achar que sou.

Não há nobreza em se arrastar de volta à vida quando tudo em mim pede para desistir. Não há beleza em costurar-se toda noite, apenas para não assustar os outros pela manhã. As pessoas dizem: “Se fosse eu, não conseguiria.” Mas o que elas não entendem é que eu também não consigo, eu só vou. Eu só continuo seguindo, porque assim preciso. Não porque posso, mas porque parar de tentar seria sumir de vez. E apesar da dor, ainda há algo em mim que se agarra ao que resta.

Todos os dias, algo morre em mim. Uma esperança. Uma ideia. Um sonho. E ainda assim, me levanto. Não porque sou feita de ferro. Pelo contrário: sou feita de carne. Carne que sangra, que cansa, que treme. Mas que também sente. E, por sentir, ainda encontra alguma coragem pra seguir. Mesmo que seja cambaleando.

Ao contrário do que costumo ouvir, não sou uma vencedora. Sou alguém que ainda luta muito pra simplesmente ficar de pé. Não venci nada, estou no meio da batalha. Sou como um gladiador em sua arena, coberto de cicatrizes, exausto, enfrentando um inimigo que vive dentro de mim. Essa arena é a minha mente. E ela me manipula, me testa, me desafia a cada pensamento que sussurra desistência.

Não tenho armaduras douradas. Não tenho escudos impenetráveis. Só tenho uma ferramenta: a coragem de continuar. Principalmente por aqueles que amo. Por minha filha, que é chão, luz e razão. Ela merece de mim o melhor possível, mesmo quando o melhor que posso oferecer é apenas mais um dia. Mais uma tentativa.

A cada queda, a cada crise, me remonto com o que sobrou. Não há manual. Não há luz divina. Há só esse gesto quase absurdo de continuar tentando. Meus cacos já não se encaixam como antes. Há partes de mim que ficaram pra trás. Há espaços vazios que talvez nunca se preencham. Mas ainda assim, sou.

Não sou uma vitrine de superação. Sou resistência do meu próprio ser. Um corpo que insiste em se manter habitado, mesmo quando tudo em mim grita pelo fim. Minha luta não é exemplo, é necessidade. É esse grito silencioso de quem não desiste de existir, mesmo quando viver parece doer mais que partir.

Se me levanto, não é porque sou inabalável. É porque, apesar de tudo, ainda há uma centelha, frágil, quase apagada que resiste.

E, enquanto houver essa pequena chama, eu continuo...

No início fui tímida, frágil no olhar,

tremendo em seminários, temendo falar,

mas o tempo, paciente, firmou minha voz,

fez da insegurança um caminho de nós.


Cada disciplina, com seu rigor,

não foi fardo e tampouco temor,

foi sempre horizonte, foi chão a plantar,

foi vida pulsando em saberes no ar.


Na travessia de torna-se professora,

um vir-a-ser tecido em encontros,

nos estágios brotaram bonitezas,

no afeto das crianças, sementes de doçura, mas também de firmeza. 


Conciliar foi luta e também ternura,

ser mãe e estudante em árduo caminho,

no abraço da filha encontrei doçura,

e nos estudos teóricos fui traçando meu destino.


Na reta final, um fantasma insistiu,

a depressão em mim se instalou e feriu,

mas firme fiquei, não deixei de lutar,

da Filosofia desisti, mas na Pedagogia quis ficar.


Sou ponte erguida, sou verbo a brotar,

sou professora em vir-a-ser,

como disse Freire, “inacabado eu sou”,

aprendo ensinando, é no outro que estou.


A história continua, sem ponto a deter,

sou ser inconclusa no ato de aprender,

na travessia sigo, em constante construção,

pois a educação que acredito é política: é poder de transformação!